Dia Nacional da Caatinga: a importância de preservar o bioma

No dia 28 de abril é celebrado o Dia Nacional da Caatinga, uma data dedicada a valorizar e preservar um bioma que é exclusivamente brasileiro. A Caatinga ocupa cerca de 11% do território do país e está presente em estados como Bahia, Pernambuco, Ceará, Piauí, Rio Grande do Norte, Paraíba, Alagoas, Sergipe e parte de Minas Gerais. O nome "Caatinga" vem do tupi-guarani e significa “mata branca”, em referência ao aspecto esbranquiçado da vegetação durante os períodos de seca, quando muitas árvores perdem suas folhas para economizar água.
O clima da região é semiárido, com chuvas escassas e mal distribuídas ao longo do ano. Em geral, a estação chuvosa dura de três a cinco meses, enquanto o restante do ano é marcado por estiagens prolongadas e temperaturas que frequentemente ultrapassam os 30 °C. Mesmo diante dessas condições extremas, a vida na Caatinga se adapta de maneira surpreendente. A vegetação é composta principalmente por arbustos e árvores de pequeno porte, muitas vezes com folhas reduzidas ou transformadas em espinhos, adaptações que ajudam a reter a pouca umidade disponível.
Espécies que, em outros biomas, alcançariam grande porte, na Caatinga se desenvolvem com troncos retorcidos, raízes profundas e copas baixas, como forma de reduzir a perda de água e resistir aos ventos e ao solo pedregoso. A jurema-preta (Mimosa tenuiflora), por exemplo, é uma planta emblemática da região, conhecida por sua resistência e múltiplos usos. Trata-se de um arbusto espinhoso de folhas pequenas, que perde sua folhagem na seca e volta a rebrotar rapidamente com as primeiras chuvas. Suas raízes ajudam a fixar o solo, e sua casca é rica em taninos com propriedades medicinais.
Já o mandacaru é um cacto de grande porte que resiste aos longos períodos de seca. Além de ser usado como planta ornamental, ele também tem valor prático: serve como uma das poucas alternativas de alimentação para os animais durante as estiagens prolongadas. Sua presença no cenário do sertão vai além do campo, ele dá nome a bairros, povoados e até cidades, reforçando sua conexão com a cultura local.
O umbuzeiro, muitas vezes chamado de “árvore sagrada do sertão”, é uma planta extremamente versátil, e seus frutos são amplamente consumidos. Suas flores atraem abelhas nativas, contribuindo para a polinização das espécies da região. Além disso, suas raízes espessas armazenam água, o que não só garante sua sobrevivência no clima semiárido, como também fornece matéria-prima para usos culinários e medicinais pela população.
Os solos da Caatinga, em grande parte, são rasos, pedregosos e com baixa fertilidade natural. Ainda assim, áreas mais férteis podem ser encontradas nos vales e margens de rios intermitentes, aqueles que só têm água durante parte do ano. Nessas áreas, a agricultura e a pecuária se concentram, mas o uso inadequado do solo, sem cobertura vegetal, acelera os processos de degradação e desertificação. A escassez de água, por sua vez, é um dos maiores desafios ecológicos e sociais da região, afetando tanto a biodiversidade quanto milhões de pessoas que dependem dos recursos naturais para sobreviver.
Apesar dos desafios, a Caatinga abriga uma biodiversidade rica e única. São mais de 4.000 espécies de plantas e uma fauna especialmente adaptada ao clima seco. Entre os animais endêmicos está a jandaíra (Melipona subnitida), uma abelha nativa e sem ferrão, essencial para a polinização das plantas da região e muito valorizada pelas comunidades locais. Outro exemplo é o mocó (Kerodon rupestris), um roedor que vive entre rochas e se adapta bem aos ambientes áridos.
Entre as aves mais conhecidas da Caatinga, destaca-se a asa-branca (Patagioenas picazuro), uma pomba de coloração cinza-arroxeada que costuma ser vista em bandos, principalmente durante a estação seca. Embora não seja exclusiva da Caatinga, já que ocorre também em outros biomas e países da América do Sul, a asa-branca se tornou um verdadeiro símbolo do sertão. Seu comportamento migratório, buscando áreas mais úmidas nos períodos de estiagem, inspirou a célebre canção "Asa Branca", de Luiz Gonzaga, que retrata a força, a saudade e a resistência do povo nordestino. Mais do que uma ave, a asa-branca representa a conexão entre natureza e cultura, mostrando como a fauna da Caatinga está profundamente ligada à identidade das pessoas que vivem nesse bioma.
Além dela, a Caatinga abriga espécies de aves que ocorrem exclusivamente nesse ecossistema, como o soldadinho-do-araripe (Antilophia bokermanni). Com seu topete vermelho vibrante e corpo branco, essa pequena ave é considerada um dos símbolos da conservação da Caatinga. Endêmica do sul do Ceará, sua distribuição é extremamente restrita, ocorrendo apenas em áreas de mata úmida associadas a fontes de água, os chamados brejos de altitude. A destruição do habitat, o desmatamento e o uso desordenado da terra colocam o soldadinho-do-araripe em sério risco de extinção.
Infelizmente, a Caatinga vem enfrentando pressões crescentes. O desmatamento, as queimadas, o avanço desordenado da agricultura e da pecuária e os efeitos das mudanças climáticas ameaçam a integridade do bioma. Hoje, mais de 46% da sua vegetação original já foi desmatada, e apenas cerca de 9% da área está protegida por unidades de conservação. Essa perda compromete não apenas a biodiversidade, mas também os serviços ecossistêmicos essenciais, como o fornecimento de água, a regulação do clima e a fertilidade do solo.
Um estudo recente, publicado em 2023 na revista Journal of Ecology, trouxe dados preocupantes sobre o futuro da Caatinga diante das mudanças climáticas. Pesquisadores de diversas instituições brasileiras reuniram mais de 400 mil registros de ocorrência de cerca de 3 mil espécies de plantas do bioma e, com o uso de modelos estatísticos e inteligência artificial, projetaram cenários futuros com base no aumento da temperatura global.
Os resultados indicam que, até 2060, 99% das comunidades de plantas da Caatinga poderão sofrer perdas significativas de espécies, além de uma homogeneização da paisagem, com a substituição da vegetação típica por espécies mais comuns e resistentes à seca. Essa transformação pode levar à perda de até 40% da diversidade biológica em algumas regiões, tornando o bioma mais esparso e vulnerável. O estudo completo pode ser acessado na Agência FAPESP: Clique aqui para acessar.
Celebrar o Dia da Caatinga é, acima de tudo, reconhecer a importância de um bioma que é símbolo de resistência e adaptação. Preservá-lo é essencial para manter a biodiversidade brasileira, proteger os modos de vida tradicionais e garantir um futuro sustentável para milhões de pessoas. Que essa data sirva de reflexão e também de ação, para que a Caatinga continue viva e pulsante em meio ao semiárido brasileiro.