Cerrado em Cores: Arte, Ciência e Comunidade pela Conservação

Cerrado em Cores: Arte, Ciência e Comunidade pela Conservação

No Dia Nacional do Cerrado, celebramos mais do que uma data no calendário — reforçamos um convite à reflexão e à ação. Conhecido como a “caixa d’água do Brasil”, este bioma abriga nascentes que alimentam oito das doze grandes regiões hidrográficas do país, incluindo rios que sustentam o Pantanal, a Amazônia, a Caatinga e a Mata Atlântica. Também é o berço de aquíferos estratégicos, como o Guarani e o Urucuia, essenciais para o abastecimento de milhões de pessoas.

O Cerrado também é considerado a savana mais biodiversa do planeta: são cerca de 6 mil espécies de plantas e uma notável variedade de animais endêmicos, segundo o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Mamíferos emblemáticos como o lobo-guará (Chrysocyon brachyurus), o tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla), o veado-campeiro (Ozotoceros bezoarticus) e o tatu-canastra (Priodontes maximus) convivem com centenas de aves, répteis, anfíbios e insetos que compõem um mosaico ecológico único. Muitas dessas espécies desempenham papéis essenciais: o lobo-guará, por exemplo, ajuda a dispersar sementes como a lobeira (Solanum lycocarpum), enquanto as abelhas nativas, presentes em grande parte do bioma, são indispensáveis para a polinização de frutas, flores e plantas que sustentam tanto a fauna quanto a agricultura.

Apesar de sua riqueza, o Cerrado enfrenta sérias ameaças. Estima-se que mais de 50% da sua vegetação original já tenha sido perdida, sobretudo para a expansão agropecuária. Esse desmatamento acelerado compromete não apenas a biodiversidade, mas também o equilíbrio climático e o ciclo das águas em todo o país. Por isso, celebrar o Cerrado em sintonia com projetos que unem conservação, cultura e desenvolvimento sustentável é reafirmar a urgência da sua proteção.

Um exemplo inspirador vem do Projeto Canastras e Colmeias, lançado em 2015 para mitigar conflitos entre apicultores e tatus-canastra, que invadiam apiários em busca de alimento em áreas degradadas. Para enfrentar o problema, foram desenvolvidos o Guia de Convivência entre Apicultores e Tatus-Canastra e o Selo Amigo do Tatu-Canastra, concedido a produtores que adotam práticas de mitigação não agressivas e sustentáveis. Atualmente, mais de 100 apicultores em quatro Estados já foram certificados, demonstrando que é possível gerar economia por meio da conservação.

O Projeto Canastras e Colmeias conta com o apoio da Log Nature, por meio de seu edital anual de fomento a iniciativas de conservação. A parceria fortalece ações que unem ciência, comunidades locais e conservação da biodiversidade, contribuindo para a proteção do Cerrado e de espécies emblemáticas, como o tatu-canastra.

No último mês de agosto, o projeto também ganhou vida nas ruas. Três cidades de Mato Grosso do Sul: Ribas do Rio Pardo, Três Lagoas e Brasilândia, foram transformadas pelos murais da série “Cores do Cerrado – Arte, Natureza e Comunidade”, criados pelo artista Fernando Berg. As obras celebram a biodiversidade local com poesia visual, destacando o tatu-canastra, as abelhas e a apicultura como elementos-chave da convivência sustentável.

Em cada cidade, a arte contou uma etapa da jornada do tatu em sua relação com as abelhas. Em Ribas do Rio Pardo, o encontro com espécies solitárias como a abelha-do-óleo (Centris analis) e a abelha-das-orquídeas (Euglossa) marcou o início da narrativa. Em Três Lagoas, a transição para o coletivo foi representada pelo ipê-amarelo polinizado pela mamangava (Bombus morio) e pela abelha tujuba (Melipona rufiventris), que conduzem os personagens a um portal em forma de colmeia. Já em Brasilândia, o tatu aparece transformado, voando ao lado de abelhas sociais como a mandaçaia-da-terra (Melipona quinquefasciata) e a manduri (Melipona orbignyi), acompanhado dos frutos e flores da guavira, símbolo de Mato Grosso do Sul.

Além da arte urbana, a programação envolveu feira de produtos do mel e atividades de educação ambiental, aproximando ciência e comunidade. “Queremos mostrar que a conservação pode caminhar junto com o desenvolvimento local. Através da arte, damos visibilidade ao trabalho dos apicultores, que produzem de forma sustentável e se tornam grandes aliados na proteção do tatu-canastra e de todo o Cerrado”, explica Gabriela Longo, bióloga e coordenadora do projeto.

Esses murais representam muito mais do que pinturas urbanas: são verdadeiras pontes entre ciência e comunidade. Segundo o ICAS, eles homenageiam o tatu-canastra e os apicultores como guardiões do Cerrado, reforçando que conservar também é criar, educar e celebrar. “Com esses murais, celebramos a coexistência entre apicultores e o tatu-canastra. É também um passo para valorizarmos ainda mais o mel sul-mato-grossense e, quem sabe, criarmos no futuro uma grande Festa do Mel no Estado”, destaca Arnaud Desbiez, presidente do ICAS.

Assim, ao unir arte, ciência e comunidade, o Projeto Canastras e Colmeias mostra que conservar o Cerrado também é celebrar sua diversidade cultural e natural, e que proteger o bioma é proteger o futuro.

Colaboração especial

Este texto foi elaborado em parceria com o ICAS - Projeto Tatu Canastra, apoiado pelo nosso programa de incentivo a projetos de conservação. Agradecemos à bióloga Gabriela Longo, coordenadora do projeto, por sua dedicação à preservação da fauna e pelo compartilhamento de conhecimentos que inspiram nosso compromisso com a conservação.